VIOLÊNCIA DE GÊNERO É TEMA DA SEMANA DE COMUNICAÇÃO

A apresentação dos curtas Da Janela (2009) e Brancura (2016) reforçam a importância de falar sobre o assunto através da arte e da comunicação em geral

Por Mateus Lima

Carla Tôzo

A oficina organizada pelo professor Luiz Fernando Lopes Tabet teve como convidada a professora Giovana Aparecida Zimermann, graduada em Licenciatura em Desenho na Escola de Música e Belas Artes do Paraná (EMBAP), com especialização em Linguagem Plástica Contemporânea pela UDESC e doutorado em Literatura pela Universidade Federal do Estado de Santa Catarina, UFSC.

A professora falou sobre o seu trabalho como roteirista e diretora na trilogia ficcional Os três tempos, em que discute a violência contra a mulher inspirada pelos estudos de Jacques Lacan, O instante de ver O tempo de compreender e o Momento de concluir, além de exibir os filmes Da Janela e Brancura. “Eu acho que nós vivemos em um momento político fundamental para que o audiovisual se posicione, em todos os âmbitos, seja no Rádio, Tv ou trabalho de arte, porque são debates que estão relacionados com o tempo crítico que vivemos, o tempo político”, disse.

Foto: Mateus Lima

Giovana enfatizou a importância do acesso a essas profissões para pensar questões sobre o passado e construir um futuro diferente. “Se a gente não conhece a história, a história nos atropela. E acho que uma parcela muito grande da sociedade, simplesmente, passou pela história, talvez, muito confortável para se preocupar e ter empatia com outro, e para valorizar todo o avanço social que a gente teve em várias questões da minoria.”

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BranCura: Um Desabafo Poético – ensaio crítico de Luiz Rosemberg Filho

Filme completo

Muito raramente, nos dias de hoje, vê-se um diálogo fluente entre o cinema e a poesia. A palavra e a imagem nesse lugar, onde se vai contar uma história, um sonho, um trauma, um momento… Que me permito chamar de silêncio. Silêncio este que nos conduz, ou não, ao sublime encantamento das análises, dos afetos e desejos. Na verdade, uma transcendência do real! Se bem entendo, o desejo de uma nova percepção do mundo da mulher. O particular poetizado, rompendo com o ser/mercadoria. E, no que vai digerindo o espaço da dor, o movimento da personagem realiza intervenções poéticas que terminam com dois poemas diretamente ligados à consciência e à liberdade de ser demasiadamente humana.
O cinema talvez seja esse encontro de opostos. Mapeador de movimentos duros e afetos. E precisamos, sim, da ficção para ensaiarmos um ser mais humano e melhor, pois todos os sistemas existentes não nos autorizam a valorizar o entendimento, o afeto e a criação seja ela lá qual for. Querem a violência, a miséria, o espetáculo, a fome, a guerra… E, no que reina uma densidade infinita de vazios, o desprezo passa ser, sim, pelo saber e pelo humano! O desprezo cultivado na política, na religião, na burocracia, no trabalho, nos afetos e na própria vida. Eis, pois, no nosso caso, a doença do capitalismo: o horror reservado aos poucos que ainda pensam, sonham, fazem e amam.
Considero imoral e injusta a força medíocre da burocracia. E foi sempre assim. É assim, e continuará sendo assim! Basta ver a força dos porcos e imundos nas repartições públicas. Digamos, associações e lembranças de significações desumanas passadas, e, na verdade, sempre presentes. E, entre clichês e percepções, o tempo da mulher sofrida, sendo poeticamente observado por Giovana Zimermann, no seu delicado e angustiante “BranCura”. Um filme de livre engajamento com o universo da narrativa poética.
Como bem fala Todorov: “Para produzir a obra de arte, deve-se aceitar o mundo, uma prática que começa com a tolerância, prossegue com atenção e respeito e culmina no amor – um amor despojado do desejo egoísta de posse”. Mas, “branCURA” não é uma ilustração televisiva das novelinhas e novelões do universo da mulher, mas o niilismo e a brutalidade sendo questionados pelo cinema autoral. Assiste-se, com muita angústia, à capitulação da dor e ao soerguimento da vida como obra de arte.
O filme de Giovana Zimermann arrebata e comove em tentar compreender o lento movimento do desencanto da personagem, lindamente vivida por Angélica Mahfuz. Tudo se passa como se o insensível lado dos afetos fosse o personagem principal. Não é, mas se faz presente! Penso em
Clarice Lispector, Rilke, e Antonioni, no seu “Deserto Vermelho”, em… são muitas as referências. A jovem e talentosa atriz vai levantando os véus obscuros do seu trauma, da sua solidão, e o faz com lentos movimentos que lembram as esculturas de Rodin. E, no seu percurso dos desencontros, a violência, as cicatrizes, o sangue, as dores, o gesto e talvez a morte.
Um filme de esvaziamentos dos avessos lados das dúvidas, que são as tantas e tantas certezas nas quais somos atados, da educação à morte. Das famílias mal formadas pela religiosidade aos hospícios. No filme, uma rica tentativa de reunificação de pedaços vindos do esgotamento. O esgotamento na presença e nas imagens, que remetem a uma musicalidade ainda que sofrida, poética. John Cage dizia que: “Um meio de escrever música: era o de estudar Duchamp”. Precisa falar mais?
O curta “BranCura” é uma pequena ópera visual de passagens, que nos remetem a Chopin, Satie e, por que não, a Billy Hollyday? Imagens poéticas que se multiplicam numa meditação sensível sobre o uso da violência no mundo da mulher. A mulher/intuição. A mulher/dor. A mulher/poesia. A mulher/saber. A mulher/sonho. A mulher/mulher, com seus encontros, desencontros, caminhos e espaços. Aliás, a jovem e bela atriz é uma experiência criativa única no nosso cinema. É mais que a personagem e se deixa levar pelos ventos da criação. Uma projeção ímpar de um compartimento afetivo com o tema. E a interpretação dessa talentosa atriz, me fez lembrar muito a música “Gymnopédies”, de Erik Satie, numa corporeidade real da dor, capaz de fazer doer a percepção do outro. Que no seu processo de construção e movimentos vive caminhos obscuros muito comuns; mais às mulheres pobres.
E mais: uma atriz que me faz ir além da sua representação, num processo de interiorização do cotidiano trabalhado não como ofício, mas como paixão. Que faz da presença e do movimento uma experiência adquirida, numa espécie de ressignificação de eus. Eus que nos fazem renascer entre sonhos, impulsos e ações desafiadoras para verdadeiros atores! Personagem que se metamorfoseia em cada situação, indo das tantas subjetividades da atriz, a uma verticalidade de situações concretas. E Giovana Zimermann a filma como um conjunto de potências extraídas do mundo, como anti-espetáculo, com o corpo físico ligado a uma interioridade dilatada, capaz de estabelecer uma espécie da brancura de onde o filme parte, resgatando percepções e sentimentos no cultivo da delicadeza. Como diria Rimbaud: “É falso dizer: eu penso;/ Deveriam dizer: pensam-me”. Ou seja, não vos apiedai dela! Ela é só uma multiplicidade poética de imagens e ideias. Ela, se enfaixando com gazes, de costas para o quadro, é quase a vivência de uma dança sem movimento. Que prazer ver essa bela atriz se procurar na personagem!
De algum modo a personagem tenta criar uma obra de arte que lembra tanto uma vagina como um cinto de castidade. É a presença do sublime da criação do fazer! Um filme que desconfigura o banal na procura poética do real. Afinal, o que é a vida? Kafka diria que “o significado da vida é que ela termina”. Daí pra frente é, sim, a tentativa do encontro e do prazer nem sempre fácil. E, ao criar sua narrativa complexa, Giovana Zimermann, transcende experimentações e regras no movimento musical das imagens. “BranCura” é um filme/sonho, ilustrado com imagens delicadas e poderosas de uma artista visual ímpar no nosso cinema. Por fim, a imagem como realidade de encontros e afetos partidos. Herança maldita da má formação de todos nós. E, entre o desejo e o real, uma soma infinita de sonhos irrealizados, tendo de um lado seres que fingem, do outro os doentes e entre os dois os que se deixaram morrer para a vida. E entre medos e angústias, o vagar sem direção. Por fim, diante da água, seu encontro com a poesia de Baudelaire e Cruz e Souza. Uma maneira solar, de se entender, de se possuir como mulher. E não ser possuída como um simples objeto descartável. Isso a TV e a religião fazem melhor!

LUIZ ROSEMBERG FILHO/RÔ

O filme na qorpus

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CINE DELAS [FLORIPA]

A violência de gênero atinge mulheres de todos os continentes e precisa ser encarada em sua raiz, que tem relação com as estruturas econômicas, as relações de poder, as tradições culturais e as organizações sociais. Nos últimos anos as temáticas sobre a violência de gênero passaram a fazer parte dos discursos cinematográficos, principalmente entre as obras de baixo orçamento. No dia 29 de junho (sexta-feira) o Cine Delas Floripa exibirá dois filmes que discutem a misoginia e o feminicídio. O curta “A Menina Só” DIREÇÃO: Cíntia Domit Bittar e o curta “Da Janela”, DIREÇÃO: Giovana Zimermann e Sebastião Braga.

 

 

 

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II Mostra Sesc de Cinema branCURA ganhou destaque em direção de arte

 

O curta-metragem branCURA  ganhou destaque em Direção de Arte na II Mostra Sesc de Cinema em 2018, o que me alegra muito como diretora e também como diretora de arte, função que  dividi com Policarpo Graciano.

A arte não está somente na construção estética, mas na  construção dramatúrgica também. A protagonista Aimèe ( Angélica Mahfuz), é uma artista visual, e, é através dos seu imaginário que o espectador entra em contato com o filme. São diversas as referências da História da Arte na construção do roteiro do filme, algumas intencionais (citações) e outras que foram surgindo, mesmo depois do roteiro escrito.

A cena em que Aimèe está diante do “quadro-armário”, que é uma reprodução da obra Composição com vermelho, amarelo e azul (1935-1942) de Piet Mondrian, é uma referência direta à fotografia Le Violon d’Ingres, de Man Ray. Com lápis e tinta, Man Ray transforma o corpo de Kiki (uma das primeiras mulheres verdadeiramente independente do início do século XX) em um objeto, um violino, isso porque o violino era também um hobby do pintor Ingres. A intenção foi trazer para discussão o papel das mulheres nas artes visuais, na condição de musa, que, ao mesmo tempo, se converte em um objeto.  Se tratamos no filme, sobre a violência contra a mulher, a arte precisava perpassar tudo isso. E se em algum momento, esse em que entregamos o enquadramento para o exotismo da mulher promovido na história da Arte por Man Ray. Em outro ele foi pensado pelos olhos de Frida Kahlo.  Henry Ford Hospital – La cama volando, inspirou, esteticamente, a cena do hospital. Para, então, olhar para o corpo da mulher de outras formas; entender que se trata de um corpo que sente, que sofre.

 

O título do filme é motivado pela ideia lacaniana de que a arte se constrói em torno do vazio (branco), o artista tem na criatividade uma forma de restabelecer seus laços com o mundo (CURA). ” Simultânea, porque é vazio não é posterior ao que é dito, como poderíamos crer ao pensar no silêncio que se segue a todo discurso ou nos espaços “brancos” que pontuam a fala”. (Anne Cauquelin, 2006) A arte começa onde o que não pode ser dito, pode ser mostrado e, até mesmo exibido. Então, o suspeito é olhado pela obra de arte, o que pode lhe provocar um efeito perturbador.

Giovana Zimermann

Para saber mais acesse: ARTIVISMO: OS TRÊS TEMPOS PARA O EMPODERAMENTO – REDISCO

“E, ao criar sua narrativa complexa, Giovana Zimermann, transcende experimentações e regras no movimento musical das imagens. “branCura” é um filme/sonho, ilustrado com imagens delicadas e poderosas…” Luiz Rosemberg Filho BranCura: Um Desabafo Poético

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branCURA , 2016

 

 

Whiteness  – not recommended for viewers younger than 12 years old

After suffering several violences in her childhood and adolescence, Aimèe (Angélica Mahfuz), despite her beauty, she always tries to not be noticed, sublimates to her sensuality, understanding it as a threat. She thought of taking her own life, but Louis (Johny Bruckhoff) stops her from doing that. She uses art against an obsessive neurosis and sees in hers creative process a possibility of filling the gap left by the trauma. 

Whiteness

 

branCURA – não recomendado para espectadores menores de 12 anos

Depois de sofrer várias violências n infância e adolescência, Aimèe (Angélica Mahfuz), apesar de sua beleza, tenta sempre não ser notada, sublima sua sensualidade, entendendo-a como uma ameaça. Ela pensou em tirar a própria vida, mas Louis (Johny Bruckhoff) a impede de fazer isso. Ela usa a arte contra uma neurose obsessiva e vê em seu processo criativo a possibilidade de preencher a lacuna deixada pelo trauma.

FICHA TÉCNICA

DIREÇÃO

Roteiro e direção: Giovana Zimermann

1º Ass. de Direção: Thais Aguiar

2° Ass. De Direção: Thais Alemany

ELENCO

Prod. Elenco: Elianne Carpes

Preparação de elenco: Elianne Carpes

Aimée: Angélica Mahfuz

Louis: Johny Fabricio Bruckhoff

Avó Julieta: Elianne Carpes

Angélica Mahfuz

Johny Fabricio Bruckhoff

Elianne Carpes

FOTOGRAFIA

Diretor de Fotografia: Roberto Santos (Tuta)

1º Assis. de Câmera: Cristina Kreuger (Kike)

2º Assis. de Câmera: Danilo Rossi

Câmera subjetiva: Johny Fabricio Bruckhoff

Still: Beta Iribarrem

Making off: Leandro Elsner

PRODUÇÃO

Direção de Produção: Marina Teixeira

Secretária Produção: Roberta Iribarrem

Platô: Leandro Dias

 

ARTE

Direção de Arte: Giovana Zimermann e Policarpo Graciano Pinto

Assistente de arte: Maria Fernanda Bin

Beleza: Kellen Kristine Silveira

Figurino : Singra Zimermann

 

ANIMAÇÃO

Desenho: Giovana Zimermann

Animação stop motion: Camila Kauling Rumpf

Pós produção: Moacir  Barros

 

FINALIZAÇAO

Editor:  Alan Porciuncula

Color Grading:  Alan Porciuncula

1º corte: Rodrigo Goes

DESIGNER DE SOM

Daniel Téo e  Marcelo Téo

TRILHA

Kamma No Noruega- Terra Sonora, Daniel Téo e Marcelo Téo

Operador Som: Paulo Achut Cicero

Voz off : Angélica Mahfuz

Voz off francês: Thais Alemany

ELÉTRICA

Chefe de Elétrica: Hercules Jerônimo Jesus

1º Assis. De Elétrica:  Carlos Lenine, Lenon Oliveira

 

MAQUINÁRIA

Chefe de Maquinaria: Claudio Reginatto

1º Assis. Maquinaria: Lenon Oliveira

filmebranCURA facebook

BranCura: Um Desabafo Poético – ensaio crítico de Luiz Rosemberg Filho

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Da Janela, 2009

SINOPSE: Fotógrafa pesquisa a violência contra a mulher. Através da janela de sua casa ou carro, seu “olho câmera” registra tudo. Os planos se cruzam, criando um universo onírico composto de cenas de violência simultâneas a cenas de uma festa, propiciando a reflexão de que ao mesmo tempo em que o espectador assiste ao filme, muitas mulheres anônimas são expostas à violência.

FICHA TÉCNICA:

Título original: Da janela Lançamento: 2009 (Florianópolis — SC – Brasil)

Direção: Giovana Zimermann e Sebastião Braga.

Atores: Elianne Carpes, Giovana Zimermann, Luiz Claudio Leite, Marcos José Santin, Marta Cesar e Noara Quintana. Duração: 15 min. Gênero: Drama.

Roteiro: Giovana Zimermann.

Produção: Sofia Mafalda.

Fotografia: Martin Carvalho.

Direção de arte: Lina Lavoratti.

Edição: Tiago Santos.

Trilha sonora: CURANDERA: Composição e Vocal: Guilherme Zimermann Kummer Arranjo Musical: Frederico Teixeira e Du Gomide.

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O JARDIM COMO OBRA”, 2009

 

DA CERTIDÃO DE NASCER

Nasci onde?

Nasci onde a geografia se faz de sentimento

(…)

Permaneço aqui

Mesmo assim.

Nasço onde geografia se faz de sentimento.

Entre princípio e fim de mundo.

Aurora a aurora.

          Segundo a segundo[i].

O título, O jardim como obra,  diz respeito ao processo criativo, ele surgiu quando sobrevoava uma área repleta de monoculturas, tal imagem, no período, me remeteu à uma poesia intitulada Minifúndios, do escritor catarinense, Lindolf Bell.  No livro O Código das Águas,   encontrei  também a poesia Na Certidão de Nascer, que me pareceu adequada ao projeto. A poesia foi gravada em uma estrutura de aço Cor 400, cujo design lembra um artefato indígena (um cesto de vime), que emoldurou uma árvore, que no período, deveria ser preservada.

 

Localização: Av. Othon Gama D’Eça, Centro        2009

URL

[i] ” O Código das Águas, Lindolf Bell, Global Editora 2001, p:30

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